Aconchegada num dos
ramos da sua árvore preferida, pensou que aprender a ler talvez tivesse sido a
sua maior conquista!
Que quando sabemos ler
somos maiores e mais importantes.
E ela aprendera a ler
muito antes de ir para a escola. Não, não era sobredotada! Nada disso.
Provavelmente era mais curiosa que os demais. Queria saber todos os, porque
sim, os porque não, os porque assim-assim, e os porque nunca nem sim nem não! E
os Avós, o Pai e a Mãe, a sua Ana, tinham sempre muito tempo e paciência para
os seus porque tudo!
Quando chegou à escola
ela conheceu Dona Laura, a professora mais maravilhosa que alguém pode ter. Mas
já tinha aprendido a ler no vento, no verde das árvores, nos passinhos das
formigas que costumava observar tronco acima tronco abaixo, no murmurar das
águas do rio, nas piruetas dos peixes ensaiadas ao fim da tarde quando o seu
rio, o Douro, ficava da cor da prata. Sabia ler a doçura e a raiva da chuva, as
cores do céu e do mar e jurou um dia fazer um colar com pérolas de granizo!
Tinha aprendido a
partir as palavras, a cheirá-las, a mastigá-las e a engoli-las bem devagar
tomando-lhes o sabor e a textura… Que antes de aprender a ler temos de saber
que, há palavras perfumadas, coloridas, palavras que picam, palavras livres,
palavras que nos cobrem como mantos de ternura. Isto tudo aprendera ela a ler
sem saber ler. Nas histórias e palavras que ouvia em seu redor aprendera a ler
sem ter ido à escola!
Dona Laura ensinara-lhe
a juntar as letras, as letras que formam as palavras que tão bem sabia ler! E
ensinara-lhe a ler melhor nas entrelinhas, a inventar outras palavras e a
viajar de sonho!
Por isso decidiu que
todos os seus meninos aprenderiam a ler assim! Talvez agora os adultos que a
acham uma pessoa esquisita, percebam porque observam os seus meninos os
bichinhos da relva, porque tentam adivinhar perfumes no ar, porque cantam e partem
palavras!
Para aprender a ler é
fundamental gostar das palavras. Gostar e detestar para argumentar, criar e
sonhar! E claro, descobrir qual a nossa palavra preferida!
E a sua palavra
preferida ouvira a Ana. Ana sempre usava palavras enroladinhas em mantinhas de
ternura, mas a palavra mais mágica que até hoje ouvira repetia-se todas as
noites, quando depois de aconchegar-lhe a roupa ao deitar ouvia da boca desta:
- Durma bem MEU
ACALANTO!
É certo que não sabia
bem o que queria a palavra dizer, mas percebia que a palavra estava embrulhada
numa das mantinhas de ternura que só Ana sabia tecer.