quarta-feira, 22 de agosto de 2012

JANELA COM MAR A PERDER DE VISTA




Era raro o dia em que não acordasse com os passinhos de dança que as gaivotas e lavandiscas ensaiavam no telhado.

À tardinha faziam ninho por entre as telhas e ali ficavam dormindo com embalos de mar. Bem cedinho, tanto, que o próprio dia ainda esfregava os olhos meio estremunhado, iniciavam um bailado sobre telhas que se estendia ao céu e terminava sobre o azul do mar.

Saltava então da cama e correndo para a janela empurrava com força as portadas que impediam a noite de entrar se fosse esse o seu desejo. Agora, queria o mar. O mar que começava ali mesmo na sua janela, o mar que também lhe embalava o sono e os sonhos.

Não tardaria e a janela seria a porta que atravessaria para sentir o azul afagar-lhe os pés.

Na beirada, descansavam conchas engalanadas de limos, estrelas de mar enfeitavam os novelos de algas que pacientemente as ondas dobaram durante a noite.

Ficaria ali perdida entre coisas pequeninas, para voltar a entrar pela janela como quem chega do mar.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

BALADA DO REI DAS SEREIAS



O rei atirou
Seu anel ao mar
E disse às sereias:
– Ide-o lá buscar,
Que  se não o trouxerdes,
Virareis espuma
Das ondas do mar!
-
Foram as sereias,
Não tardou, voltaram
Com o perdido anel.
Maldito o capricho
De rei tão cruel!
-
O rei atirou
Grãos de arroz ao mar
E disse às sereias:
– Ide-os buscar,
Que se não os trouxerdes,
Virareis espuma
Das ondas do mar!
-
Foram as sereias,
Não tardou voltaram,
Não faltava um grão.
Maldito o capricho
Do mau coração!
-
O rei atirou
Sua filha ao mar
E disse às sereias:
– Ide-a lá buscar
Que se a não trouxerdes,
Virareis espuma
Das ondas do mar!
-
Foram as sereias…
Quem as viu voltar?…
Não voltaram nunca!
Viraram espuma
Das ondas do mar.

 
-
Manuel Bandeira






domingo, 12 de agosto de 2012

POEMA ENTRELINHAS




Tenho-te aqui entre as linhas do poema,
aqui onde o impossível ganha contornos de possibilidade.
Prendo-te ao poema para que possas acompanhar-me a solidão.
Procuro o mapa que fiz dos teus beijos, da tua boca.
Um simples esboço que não cheguei a completar
e que deixei algures num recanto da tua pele.
Não, eu não preciso de mapa para continuar o poema.
Preciso de ti!
Prendi-te ao poema
e é tão certo já tenhas escapado entrelinhas.

sábado, 11 de agosto de 2012

TARDE À ESPERA




Gaivotas cansadas de voar,
barcos à deriva na areia,
mar de pouca espuma,
homens resignados,
nuvens imóveis em céu sem cor.
Urge pintar a tarde,
para conseguir roubá-la ao tempo!

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

LER FORA DOS LIVROS



A ideia era sair para o jardim, procurar um pedaço de sombra e demorar a tarde num livro.


Mas ao passar pelo lago logo os meus olhos se detiveram numa pachorrenta rã que estendida numa folha de nenúfar apanhava sol.
 
O lago estava lindíssimo, cheio de flores “de água “, como costumava chamar na infância aos nenúfares e de pequenos juncos que ondulavam ao vento e onde duas libelinhas se penduravam num terno abraço.


 
O lago sempre exercera em mim enorme fascínio, sempre gostei de ler nele a calma das rãs esticadas ao sol, o suave bailado das folhas e flores aquáticas, os saltinhos dos peixinhos laranja que o povoam, o namoro das libelinhas e em tempos soube até ler os segredos que o vento escrevia na água…

Meus olhos procuravam a sombra, mas deparavam-se com as flores maravilhosas e de cheiros deliciosos. Dálias cheias de folhos e nervurinhas, brincos de princesa, mas meus olhos sempre acabavam por esbarrar na simplicidade infinita dos malmequeres meus preferidos.

 
E de livro atrás, ler no lago e nas flores do jardim revelou-se tão importante, que o livro ficou mesmo para trás.

domingo, 5 de agosto de 2012

CANÇÕES QUE VÃO POR CAMINHOS DE POESIA



Mester D´Amor

Si en saps el pler no estalviïs el bes
que el goig d'amar no comporta mesura.
Deixa't besar, i tu besa després
que és sempre als llavis que l'amor perdura.

No besis, no, com l'esclau i el creient,
mes com vianant a la font regalada.
Deixa't besar -sacrifici fervent-
com més roent més fidel la besada.

Què hauries fet si mories abans
sense altre fruit que l'oreig en ta galta?
Deixa't besar, i en el pit, a les mans,
amant o amada -la copa ben alta.

Quan besis, beu, curi el veire el temor
besa en el coll, la més bella contrada.
Deixa't besar
...................i si et quedava enyor,
besa de nou, que la vida és comptada.

Joan Salvat-Papasseit


quinta-feira, 2 de agosto de 2012

DAS ESTRELAS...




Das estrelas que iluminavam a sua praia e lhe molhavam os cabelos, ela sabia que ao amanhecer, cairiam tontas de sono e se apagariam na areia.

Para que pudesse colhê-las e em raminhos, oferecê-las a quem muito bem entendesse!


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

INVENÇÕES EM AZUL




Invento-te em azul pássaro,
porque hoje o céu nasceu cinza.