Já experimentaram mastigar livros?
Pois eu adoro fazê-lo, e asseguro que não tem nada de esquisito!
Gosto de ler as linhas, as entrelinhas, fora das linhas e traçar as minhas próprias linhas. Manias…
Claro que não consigo fazer isto tudo com todos os livros.
Há livros e livros. De alguns, vale só mesmo a pena ler o título, porque de tão insípido e desenxabido conteúdo, o título será o único a fazer-nos sonhar!
Mas depois há os tais livros que gosto de mastigar, aqueles, que de tão deliciosa leitura, gosto de trincar e saborear devagar, devagarinho…
Aqueles em que depois de avançar uma página, volto de novo atrás, pois tal é a beleza e riqueza das linhas e entrelinhas. Livros fascinantes, com os quais consigo não só voar, mas PLANAR!
Aconteceu-me com um dos livros de Mia Couto. Mar me quer.
Todo o livro é um verdadeiro tratado filosófico, as linhas e entrelinhas estão cheias de poesia pura e simplesmente deliciosa!
Leiam, este pedacinho…
(…) “Devia era, logo de manhã, passar um sonho pelo rosto. É isso que impede o tempo e atrasa a ruga. Sabe o que faz? Estende-se aí na areia, oblonga-se deitadinha, estica a alma na diagonal. Depois, fica assim, caladita, rentinha ao chão, até sentir a terra se enamorar de si. Digo-lhe, Dona: quando ficamos calados, igual uma pedra, acabamos por escutar os sotaques da terra. A senhora num certo momento, há-de ouvir um chão marinho, faz conta é um mar sob a pele do chão. Aproveita esse embalo, Dona Luarmina. Eu tiro boas vantagens desses silêncios submarinhos. São eles que me fazem adormecer ainda hoje. Sou criança dele, do mar. (…)
Se decidirem lê-lo e mastigá-lo, como eu , de certeza não se arrependerão.